Crianças
não são simplesmente pequenos adultos pensando de maneira menos eficiente –
elas pensam diferente. Tom Butler-Bowdon, interpretando Piaget
O principal objetivo da educação é criar pessoas capazes de fazer coisas novas e não simplesmente repetir o que as outras gerações fizeram. |
Estudos sobre o desenvolvimento humano sempre despertaram minha
curiosidade e devo dizer que ela ficou mais aguçada quando, durante um encontro
profissional na Fundação CPqD, tive a oportunidade de assistir uma palestra
sobre 'A teoria do desenvolvimento moral'
de Lawrence Kohlberg. Há muito tenho buscado formas de apresentar algo sobre
essa teoria no Mirtu's Blog, mas ainda não consegui compilar um material para
publicação. Contudo, ontem de manhã, assisti ao documentário 'Cenoura, ou Vara? Um Guia Horizon sobre Criar os Filhos' da BCC, que apresenta as diversas teorias sobre a educação
das crianças, e neste documentário há a apresentação dos estudos de Jean
Piaget, sobre o desenvolvimento cognitivo - relativo à maneira como
adquirimos conhecimento.
Desenvolvimento |
Desta forma achei pertinente dedicar uma publicação a estes estudos, e hoje contando com a magistral síntese de Tom Butler-Bowdon o Mirtu's Blog traz a resenha de 'A linguagem e o pensamento da criança'
de Jean Piaget. Tom observa que Piaget era um especialista
da observação do mundo natural, antes de voltar sua mente para questões humanas.
E que quando criança e adolescente, ele perambulava pelos riachos, colinas e
montanhas do oeste suíço coletando caracóis, e, mais tarde, escreveu sua tese
de doutorado sobre os moluscos das montanhas de Valais.
A linguagem e o pensamento da criança |
O
que ele aprendeu nesses anos – a observar primeiro e classificar depois – o preparou
bem para examinar o assunto do pensamento da criança, que tinha atraído muitas
teorias, mas não muita observação científica sólida de crianças de fato. Entrando
na área, o principal desejo de Piaget era que suas conclusões fossem tiradas
dos fatos, não importa quão difíceis ou paradoxais eles parecessem. Somando à
sua habilidade metódica, era – para um cientista – um extraordinário entendedor
da filosofia. A psicologia da criança era um emaranhado de questões epistemológicas
– teorias do conhecimento –, mas ele decidiu focar em questões muito práticas,
como: "Por que uma criança fala e para quem ela está falando?", e
"Por que ela faz tantas perguntas?".
O que eles estão conversando? |
Se
houvessem respostas, ele sabia que elas poderiam beneficiar professores em
grande medida, e foi principalmente para educadores que Piaget escreveu 'A linguagem e o pensamento da criança'.
Muitos investigadores da mente da criança tinham focado na natureza
quantitativa da psicologia infantil – as crianças eram ensinadas a ser como
elas são porque possuem menos habilidades mentais que os adultos e comentem mais
erros. Mas Piaget acreditava que não era uma questão das crianças terem mais,
ou menos de alguma coisa, mas que elas são fundamentalmente diferentes na maneira como pensam. Existem
problemas de comunicação entre adultos e crianças não por causa de lacunas de
informações, mas devido aos modos bastante diferentes como eles se entendem
dentro de seus mundos.
Nas
primeiras páginas, Piaget perguntou o que admitiu ser uma questão estranha: "Quais
são as necessidades que uma criança tende a satisfazer quando ela fala?".
Qualquer pessoa sã diria que o propósito da linguagem é se comunicar com os
outros, mas, se este fosse o caso, ele queria saber por que as crianças falam
quando não há ninguém por perto, e por que até mesmo adultos conversam com eles
mesmos, seja internamente ou murmurando em voz alta. Era claro que a linguagem não
poderia ser reduzida à função única de comunicar pensamento simplesmente.
Quais são as necessidades que uma criança tende a satisfazer quando ela fala? |
Piaget
conduziu sua pesquisa no Instituto Jean-Jacques Rousseau, em Genebra, aberto em
1912 para o estudo da criança e das ciências da educação. Lá ele observou
crianças de 4 a 6 anos, anotando tudo o que elas diziam enquanto interagiam e
brincavam, e o livro incluí transcrições de suas "conversas".
O
que Piaget rapidamente descobriu é que quando as crianças falam, em grande
parte do tempo elas não estão conversando com ninguém em particular. Estão
pensando em voz alta. Ele identificou dois tipos de discurso, o egocêntrico – que
mostra atenção apenas, ou maioritariamente aos seus assuntos – e o socializado.
Dentro do tipo egocêntrico havia três padrões:
Atenção a seus assuntos |
•
Repetição – Discurso não direcionado
a pessoas, dizendo palavras pelo simples prazer de fazê-lo.
•
Monólogo – Comentários completos que
seguem as ações ou atividades da criança.
•
Monólogo coletivo – Quando as
crianças estão conversando aparentemente juntas, mas não estão levando
realmente em conta o que as outras estão dizendo. (Uma sala de dez crianças
sentadas em mesas diferentes pode ficar barulhenta com a conversa, mas, na
verdade, elas estão todas falando consigo mesmas).
'Um Tira no Jardim de Infância' |
Ele
notou que, até certa idade (7 anos, ele acreditava), as crianças não têm "continência
verbal", e devem dizer qualquer coisa que vem à sua cabeça. Um jardim de
infância, ou uma creche, ele escreveu, "é uma sociedade na qual, a rigor,
as vidas individuais e sociais não são diferenciadas". Porque as crianças
acreditam ser o centro do universo, não há necessidade da ideia de privacidade,
ou ocultar visões por sensibilidade a outros. Os adultos, em contrapartida, por
causa de sua falta de egocentrismo em comparação, adaptaram-se a um padrão de
discurso completamente socializado, no qual muitas coisas não são ditas.
Somente loucos e crianças, digamos assim, dizem qualquer coisa que pensam,
porque para eles só eles mesmos realmente importam. É por essa
razão que as crianças são capazes de falar o tempo todo na presença de seus
amigos, mas nunca conseguem ver as coisas do ponto de vista deles.
Em função de si mesmo |
Parte
do motivo do egocentrismo das crianças é que uma porção significativa de sua
linguagem envolve gestos, movimentos e sons. Como estes não são palavras, elas
não podem expressar tudo, então as crianças devem permanecer parcialmente
prisioneiras de suas próprias mentes. Nós podemos entender isso quando
reconhecemos que, quanto maior o domínio da linguagem de um adulto, mais capaz
ele provavelmente é de compreender, ou pelo menos de estar ciente das visões
dos outros. A linguagem, na verdade, leva as pessoas para além delas mesmas,
que é a razão pela qual a cultura humana coloca tanta ênfase em ensiná-la às
crianças – elas lhes permite eventualmente sair do pensamento egocêntrico.
Piaget
tomou emprestada uma distinção da psicanálise entre os dois tipos de pensamento:
•
Pensamento inteligente ou dirigido – Tem um objetivo, adapta esse objetivo à
realidade e pode comunica-lo em linguagem. Esse pensamento é baseado em
experiência e lógica.
•
Pensamento autístico (concentração
excessiva em pensamentos e sentimentos próprios em oposição ao mundo exterior)
ou não dirigido – Envolve objetivos que não são conscientes ou adaptados à
realidade, baseado na satisfação dos desejos em vez de estabelecer verdade. A
linguagem desse tipo de pensamento são imagens, mitos e símbolos.
Pensamento autístico |
Para
a mente dirigida, a água tem certas propriedades e obedece a determinadas leis.
É concebida tanto de forma conceitual como material. Para a mente autística, a
água é somente relevante em relação a desejos ou necessidades – é algo que pode
ser bebido, visto ou aproveitado.
Essa
distinção ajudou Piaget a avaliar o desenvolvimento do pensamento de crianças
de até 11 anos de idade. Dos 3 aos 7 anos, elas são amplamente egocêntricas e
têm elementos do pensamento autístico, mas, dos 7 aos 11 anos, a lógica
egocêntrica abre o caminho para a inteligência perceptiva.
Inteligência perceptiva |
Piaget
montou experimentos nos quais era pedido a crianças para relatar uma história
que lhe fora contada ou para explicar algo, como o funcionamento de uma
torneira, que lhes tivesse sido mostrado. Antes dos 7 anos, as crianças não
ligavam se as pessoas com quem estavam falando entendiam a história, ou o
mecanismo. Elas podiam descrever, mas não analisar. Mas dos 7 ou 8 anos em
diante, as crianças não supunham que a outra pessoa entenderia o que elas queriam
dizer e tentavam dar uma explicação exata – ser objetivas. Até essa idade, seu
egocentrismo não permite que elas sejam objetivas. O que não podem explicar, ou
não sabem, elas inventam. Mas depois da idade dos 7 ou 8 anos, as crianças
sabem o que significa transmitir corretamente a realidade; isto é, a diferença
entre invenção e realidade.
Até os 7 ou 8 anos, o que a criança não pode explicar, ou não sabe, ela inventa. |
Piaget
notou que as crianças pensam em termos de "esquemas", o que lhes
permite focar no todo da mensagem, sem precisar entender cada detalhe. Quando
escutam algo que não compreendem, as crianças não tentam analisar a estrutura
da sentença ou as palavras, mas fazem tentativas de captar ou gerar um
significado geral. Ele notou que a tendência do desenvolvimento mental é sempre
do sincrético (que combina princípios) ao analítico (que analisa) – ver o total
primeiro antes de conquistar a habilidade de separar as coisas em partes, ou
categorizar. Antes da idade dos 7 ou 8 anos, a mente da criança é amplamente
sincrética, mas ela, mais tarde, desenvolve capacidades de análise que
sinalizam a passagem da mente juvenil para a adulta.
Piaget
queria saber por que as crianças, particularmente aquelas com menos de 7 anos,
fantasiam, sonham e usam tanto a imaginação. Ele observou que, por não se
envolverem em pensamentos dedutivos ou analíticos, não há razão para que façam
uma firme demarcação entre "o real" e "o não real". Como
suas mentes não trabalham em termos de casualidade e evidência, tudo parece
possível.
Tudo parece possível |
Se
uma criança pergunta: "O que aconteceria se eu fosse um anjo?" para
um adulto, não vale seguir com a questão, pois nós sabemos que isso não pode
ser real. Mas, para uma criança, tudo não só é possível como é explicável, uma
vez que a lógica objetiva não é requerida. Para satisfazer sua mente, tudo que
é requerido é motivação – por exemplo, a bola queria descer o morro, então ela
o fez. Aos 6 anos, um garoto pode achar que um rio flui colina abaixo porque
ele quer. Um ano depois, ele explicará isso nos termos "a água sempre flui
colina abaixo, então é por isso que o rio está fluindo abaixo nesta colina
aqui".
Para satisfazer sua mente, tudo que é requerido é motivação |
Por
que muitas crianças novas perguntam incessantemente "Por quê?"?
Porque elas querem saber a intenção de todos e de tudo, mesmo se for algo
inanimado, não percebendo que somente algumas coisas têm intenções. Mais tarde,
quando elas podem reconhecer que muitas coisas são causadas em vez de intencionadas, suas questões mudam para casualidade.
O período que antecede o entendimento delas sobre causa e efeito – pré-causalidade
– coincide com o período do egocentrismo.
Por quê? |
O
"mundo do faz de conta", como rotulamos no nosso mundo adulto, tem a
sensação da fria e dura realidade para crianças mais novas, porque dentro dele
tudo faz sentido de acordo com suas próprias intenções e motivações. Aliás,
como Piaget observou ironicamente, o mundo da criança parece funcionar tão bem
que, na sua percepção, a lógica não é requerida para sustenta-lo.
"Mundo do faz de conta", de Jaro Hess |
Os
adultos frequentemente acham difícil entender as crianças porque se esquecem de
que a lógica não tem papel na mente delas. Nós não podemos fazer as crianças
pensarem da mesma maneira que os adultos antes que elas atinjam uma certa
idade. A cada idade, as crianças adquirem um equilíbrio particular em relação
ao seu ambiente. Isto é, o modo como elas pensam e sentem aos 5 anos explica
seus mundos perfeitamente. Mas aquele mesmo modo não funciona quando elas têm 8
anos.
Nós não podemos fazer as crianças pensarem da mesma maneira que os adultos |
Em
trabalhos posteriores, Piaget explorou o estágio final do desenvolvimento
mental, que começa aos 11 ou 12 anos. As habilidades dos adolescentes de
argumentar, pensar de forma abstrata, fazer juízos e considerar possibilidades
futuras os fazem, essencialmente, iguais aos adultos. Desse ponto em diante, é
uma questão de crescimento das habilidades, em vez de mudanças qualitativas.
Apesar
de algumas discussões sobre os momentos precisos, os estágios de
desenvolvimento da criança de Piaget têm aguentado, em grande medida, a prova
do tempo, e o impacto deles na educação escolar e pré-escolar tem sido notável.
Estágios de desenvolvimento |
Apesar
disso, Piaget nunca se considerou um psicólogo da criança; mais precisamente,
era um cientista focado em teorias do conhecimento. Sua observação das crianças
conduziu a teorias mais amplas sobre comunicação e cognição, porque aquilo que
ele aprendeu sobre a mente da criança levou a do adulto uma visão mais clara.
Por exemplo, não eram somente as crianças que usavam esquemas para compreender
o mundo – os adultos também precisam acomodar e assimilar novas informações ao
adaptá-las com o que já sabem.
Os adultos também usam esquemas para compreender o mundo |
Piaget
inventou o campo da "epistemologia genética", em outras palavras,
como as teorias do conhecimento se desenvolveram ou mudam em reação a novas
informações. Ele entendeu a mente como uma criação relativamente arbitrária,
formada de tal maneira que a realidade possa ser explicada de acordo com o
próprio modelo do mundo de uma pessoa. A educação tem de levar em conta esse
modelos, em vez do método de simplesmente empurrar fatos pelas gargantas das
pessoas, caso contrário, as informações não serão assimiladas. Tal método de
educação resulta em conformidades maçantes que ficam desconfortáveis com
mudanças, e Piaget estava à frente de seu tempo ao sugerir que devemos educar
as pessoas para que sejam pensadoras pioneiras e inventivas, cientes da
subjetividade de suas próprias mentes, mas maduras o suficiente para acomodar
novos fatos. Seus experimentos iniciais, observando a linguagem e o pensamento
da criança, portanto, levaram a grandes percepções sobre como os adultos
processam conhecimento e criam novos entendimentos.
Pensar os processos pelos quais se produz o conhecimento |
Às
Crianças
poesia
de Angeles Arrien
Caros
Filhos do Futuro
minhas
esperanças quanto a vocês são estas:
Que
vocês possam ser Fortemente Amáveis
e
Amavelmente Fortes.
Que
o Amor possa ser o seu Guia
com a família, os amigos e os colegas.
com a família, os amigos e os colegas.
Lembrem-se
de ouvir atentamente
o
seu próprio Coração e o Coração dos Outros.
Que
vocês tenham Força para sobrepujar
o Medo e o Orgulho e, em vez deles, possam seguir
o Medo e o Orgulho e, em vez deles, possam seguir
o
que tem Paixão e Sentido para vocês.
Realizem
todos os dias alguma Ação
para
dar apoio ao Sonho de Vida de vocês,
à
Natureza do Amor e à Integridade de vocês.
Que
vocês possam zelar pela Mãe Natureza e pelas Florestas,
ajudando
todas as criaturas vivas a manter sua Dignidade.
Que
vocês possam ser uma Força Positiva atuante,
comprometida
com a comunidade.
Que
possam vocês mostrar respeito
às
Pessoas de Todas as Idades e Raças,
e
ajudar a criar um mundo melhor
para
os Pobres, os Doentes, os Anciãos e os Jovens
Que
vocês possam respeitar todos os modos
de
que o ser humano dispõe para chegar à Espiritualidade.
Que possam desenvolver
constantemente seus Dons e Talentos
todos os dias, sem hesitação nem reserva.
todos os dias, sem hesitação nem reserva.
Com profunda gratidão e
respeito por tudo o que vocês farão
para tornar a Terra um
lugar melhor em que viver.--
Cenoura, ou Vara? Um Guia Horizon sobre Criar os Filhos
https://archive.org/details/Criar.Filhos
Talking Babies
https://www.youtube.com/watch?v=_JmA2ClUvUY
Projeto do Milênio
http://jrmilton.blogspot.com.br/2010/11/projeto-do-milenio.html
Descobrir por Si Mesmo
http://jrmilton.blogspot.com.br/2011/08/descobrir-por-si-mesmo.html
'Esperando o Super-homem' - Em busca da educação
https://archive.org/details/Esperando-Super-homem
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