domingo, 12 de junho de 2011

O Segredo do Vento

De onde vêm as súbitas paixões de um homem por uma mulher, as profundas, íntimas? A sensualidade é apenas a menor causa disso; porém, quando um homem encontra reunidos num único ser a fragilidade, a necessidade de ajuda e ao mesmo tempo a petulância, ocorre nele algo que seria como se a sua alma fosse transbordar: ele fica, no mesmo instante, emocionado e ofendido. É nesse ponto que jorra a fonte do grande amor.
Nietzsche - Humano, Demasiado Humano

Blowin' In The Wind
Depois de um longo hiato o Mirtu's Blog recebe uma nova publicação. Publicação esta que originalmente começou com uma busca, entre as maiores mentes e os maiores espíritos do século XX.

Visitei a biografia de Einstein e Gandhi, conheci Andrew Wiles e Yogananda, conversei com Ibrahim Talmur e com o "seu" Sebastião, pois eu precisava encontrar uma resposta muito particular a respeito do amor. Eu já havia buscado uma resposta entre os maiores amantes de todos os tempos – Juan, Giacomo, Donatien, Ovídio, etc – e agora eu precisava de outra perspectiva.

Em verdade, a resposta estava debaixo do meu nariz, em um pequeno livro, com grandiosos ensinamentos; o qual a grande maioria das pessoas, pelo menos já ouvir falar dele. Mas antes, um prelúdio meu. Assim:

Eu amo as mulheres desde muito cedo; no jardim da infância havia uma menina, que me alegrava pelo simples fato de estar com ela; o que era aquele sentimento eu não sabia, sabia apenas que eu gostava. E gostava ainda mais quando ela fazia pipoca de mentirinha e me dava suco de ar; tudo muito simples.

Na primeira série do ensino, havia uma menina cuja presença me encantava. Só aceitei dançar quadrilha na escola depois que consegui que ela fosse meu par; ela também fez com que eu tivesse vontade de escolher as minhas próprias roupas para ir à escola, o que não adiantou, já que todos iam de uniformes.

Não foi diferente na segunda série. Havia uma menina que conseguia toda minha atenção, mesmo que eu ainda carecesse de entendimento e de qual era o sentido daquela vontade de estar com ela. O que piorou na terceira série, pois agora havia um conflito neste sentimento estranho, que consistia no fato de eu estar encantado por duas meninas. E como eu não conseguia direcionar corretamente minha atenção, decidi me dedicar intensamente aos esportes – mais precisamente ao futebol.

Depois de três anos desconhecidamente encantado por aquelas criaturas tão diferentes de mim, descobri que havia entre elas, aquelas que se encantavam por mim. E neste mesmo ano, tive uma experiência um tanto quanto diferente. Algumas meninas gostavam de me abraçar, me comprar doces e bagunçar meu cabelo – coisa ultima esta, que não me agradava muito (eu demorava longos minutos para deixar meu cabelo penteado igual ao do Super-Homem), todo o resto era esplendido.

Hoje ao me recordar disso, não tenho certeza se elas gostavam de mim, ou se gostavam de me ter ali, quase como um cãozinho que se gosta de afofar. Bem, isso não importa. Quando fui para quinta serie tudo mudou; ou quase tudo, já que agora eu estudava no andar de cima. Na minha escola as salas de aula de 1ª a 4ª serie ficavam no andar de baixo, então saíamos do pátio e descíamos as escadas até nossa sala. Agora na 5ª serie, saíamos do pátio e subíamos as escadas até nossa sala; foi a primeira vez que tive a sensação de subir na vida.

As garotas agora já não exerciam tanto encantamento sobre mim, pois eu estava apaixonado por outra coisa, mas particularmente, mais uma vez ligada ao gênero feminino: uma bola.

Tudo estranhamente complicou quando 'A Bola' se interpôs na minha relação com as meninas. Pois as meninas demandavam minha atenção e a bola tinha minha atenção. Então este pequeno conflito de interesses "arruinou" meu primeiro relacionamento. Quando minha "namorada" me perguntou: "Você quer ficar comigo, ou ir jogar bola no campinho?" – e naquele momento não parecia que havia necessidade de uma escolha, eu considerava que podia ficar com as duas, então me levantei e disse: "Vou jogar bola no campinho e depois eu volto!". E foi exatamente o que fiz, com uma parada pra tomar banho, já que o campinho em frente casa era de terra. Quando cheguei ao portão da casa dela, levei uma 'mangada' no peito – ela atirou uma manga verde em mim (sim, a fruta mesmo). O que na época não entendi bem. Depois disso tivemos um "relacionamento" instável; eu, ela, a bola e as mangas.

Nesta época eu estava na sexta serie e foi quando tive a mais estranha das minhas experiências com meninas, até então. Os meninos da minha sala começaram uma brincadeira idiota – hoje posso dizer isso – que irritava as meninas, e logo irritaria os pais delas, o que tornava tudo mais divertido. A brincadeira consistia em – durante a troca de professores – /este trecho está suprimido por poder ser considerado bullying/ meninas e sair correndo, para não levar um tabefe delas. O estranho é que depois de toda confusão que essa brincadeira causara, uma das meninas me chamou de lado e disse: "A S. pediu pra eu te dizer que ela não liga de você /este trecho está suprimido por poder ser considerado bullying/." – e esse recado me intrigou, pois, porque ela me deixaria fazer uma coisa que ela detestava que os meninos fizessem. Então para saber o motivo, fui perguntar a S., que sorrindo me disse: "Eu não gosto dos outros meninos, mas de você eu gosto" – e estranhamente aquele privilégio excepcional que ela estava me concedendo, me deixou confuso e perguntei de novo: "Como assim?" – e ela segurou minha mão e disse: "Eu gosto de você. /este trecho está suprimido por poder ser considerado bullying/.". E de repente, sem saber por que, eu tinha algum poder especial – pelo menos sobre aquela menina. Porém, além de meninas e futebol, eu gostava de revistas em quadrinhos, então por alguma razão, naquele momento me lembrei do tio Ben: "Grandes poderes, trazem grandes responsabilidades" – e fui embora, pensando na S. e no meu estranho poder. Logo a frase dos quadrinhos e a declaração da S. sumiriam da minha mente.

Aquele privilégio excepcional que ela havia me concedido, foi apenas o primeiro de uma série de outros que se sucederiam, pois de alguma forma, por alguma razão que eu não compreendia, as meninas estavam dispostas a me dar coisas, ou acesso a coisas particularmente suas, pelo simples fato de gostarem de mim. Mas logo descobri que o privilegio era concedido, mas ele vinha com um pedido implícito, algo como uma troca, na qual a minha contrapartida era eu, de forma exclusiva.

Mas isso entrou em conflito, primeiro com a entidade feminina que ainda povoava meus sonhos, 'A Bola', e com o fato de que eu perderia algum privilégio excepcional que outra menina me ofereceria. Mesmo que eu não soubesse quais eram estes privilégios, não me agradava o fato de não tê-los por algum motivo.

No colegial, com meu sonho de ser jogador de futebol e alguns princípios que se delineavam em minha mente – que formariam meu caráter –, a cadeia confusa de pensamentos sobre aquelas formas de gostar, me colocaram em um ponto de decisão. Se para ter acesso aos privilégios excepcionais das meninas, agora garotas, eu tinha que estar com uma delas de maneira exclusiva, eu decidi que tinha que escolher uma garota que provocasse em mim, aqueles mesmos sentimentos de encantamento que eu sentia nas primeiras series do meu ensino e mais, eu precisava querer estar com essa garota, só com ela, gostar dela, ter "olhos" só para ela.

A primeira garota que produziu este encantamento em mim tinha nome de princesa e foi com ela que eu aprendi que se relacionar com alguém significa alguma coisa, aliás, tudo que eu tinha vivido até ali, ganharia significado.

Era uma festa típica em uma pequenina cidade do interior e fazia frio de congelar a ponta do nariz, era o segundo dia de festa, o que indicava que eu já havia iniciado meu score, ou como eu gostava de falar depois de ficar com uma garota, até então: "Foi pra conta!".

Ela estava parada próxima a barraca de vinho quente e seus olhos faiscavam em um azul quase púrpura; sua pele alva – que lhe atribuía um ar de delicadeza – estava rosada pelo frio; seus cabelos negros brilhavam e revoavam ao vento gélido que soprava; ela estava ali, encantadoramente linda, como eu nunca tinha visto nenhuma antes dela. Era ela, de alguma forma eu sabia que era. Por ela eu renegaria qualquer privilégio, por mais excepcional que fosse com qualquer outra garota.

Purple Eyes
Pela primeira vez desde que conversara com a S., eu estava falando com uma garota que eu estava realmente interessado em estar com ela, de alguma forma eu queria que fosse diferente dessa vez. Conversamos longamente pela noite, até que me aproximei para beijá-la. Nossos corpos estavam tão próximos que eu não sentia mais frio e me perdia nas profundezas do mar que eram os olhos dela. Quando minha boca levemente tocou os lábios dela, ela virou o rosto e me disse: "Não posso.". Então meio confuso lhe perguntei: "Por que não?" – e eu pude ver aqueles olhos maravilhosos se encherem de lagrimas e ouvir: "Eu estou com alguém." – olhei rapidamente para todos os lados e indaguei: "Quem?".

Ela pegou meu queixo, enquanto mordia os lábios como se pensasse muito em algo, e me disse: "Como pode? O que é isso que acontece comigo, que me faz querer tanto beijar essa boca." – os dedos dela pareciam delinear meus lábios, nisso ela me olhou com determinação e disse: "Espere aqui. Eu preciso de alguns minutos, vou ao Hotel e volto. Não saia daqui, me espere.".

Ela demorou cerca de trinta minutos, quando voltou, eu estava com outra garota, então aquelas lagrimas que há minutos atrás apenas encheram aqueles maravilhosos olhos, agora se precipitavam ao chão em abundancia. Foi quando deixei a garota com quem estava e corri atrás dela. E ela chorava com um pesar que eu desconhecia:

"Por que Milton? Por que você não me esperou? – e eu só consegui dizer: "D., eu pensei que você não fosse voltar".

"Eu fui ligar para o meu namorado e dizer que não podíamos mais continuar juntos. Eu disse que eu não queria mais ficar com ele." – e a mão dela tocou mais uma vez a minha boca: "Eu queria ficar com você. Eu queria você." – e ao dizer isso ela fugiu de mim; desapareceu com o vento gélido que cortou meu coração e assim, nunca mais a encontrei.

Deus me deu o privilegio de amar as mulheres; algumas por anos, outras por dias, todas elas eu amei, porém sou incapaz de esquecer aquela que não amei, mas fortemente cativou meu coração. E a resposta que eu procurava veio quando...

...apareceu a raposa:

- Bom dia, disse a raposa.
- Bom dia, respondeu polidamente o principezinho que se voltou, mas não viu nada.
- Eu estou aqui – disse a voz – debaixo da macieira...
- Quem és tu? – perguntou o principezinho. – Tu és bem bonita.
- Sou uma raposa. – disse a raposa.
- Vem brincar comigo – propôs o príncipe – estou tão triste...
- Eu não posso brincar contigo. – disse a raposa. – Não me cativaram ainda.
- Ah! Desculpa. – disse o principezinho.

Após uma reflexão, acrescentou:

- O que quer dizer cativar?
- Tu não és daqui – disse a raposa. – Que procuras?
- Procuro amigos – disse. – Que quer dizer cativar?
- É uma coisa muito esquecida. – disse a raposa. - Significa criar laços...
- Criar laços?
- Exatamente. – disse a raposa.

"Tu não és para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás pra mim o único no mundo. E eu serei para ti a única no mundo..." e a raposa voltou a sua idéia:

"Minha vida é monótona. E por isso eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei o barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros me fazem entrar debaixo da terra. O teu me chamará para fora como música. E depois, olha! Vês, lá longe, o campo de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelo cor de ouro. E então serás maravilhoso quando me tiverdes cativado. O trigo que é dourado fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo..." – a raposa então se calou e considerou muito tempo o príncipe: "Por favor, cativa-me!" – disse ela.

- Bem quisera – disse o príncipe – mas eu não tenho tempo. Tenho amigos a descobrir e mundos a conhecer.

- A gente só conhece bem as coisas que cativou. – disse a raposa. Os homens não têm tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres uma amiga, cativa-me! Os homens esqueceram a verdade. – disse a raposa.

"Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas"


* Trecho de: O Pequeno Príncipe - Antoine de Saint-Exupéry

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