Nada
do que é humano me é estranho,
tudo aquilo que a
humanidade produz eu tenho que saber,
eu tenho que ter pelo
menos o direito de poder conhecer.
Mazzeo interpretando Marx
O Mirtu's Blog nasceu
de um sonho; um sonho recorrente que possuo, de um dia contribuir para
sociedade através da arte literária – e enquanto esse sonho não se concretiza,
persisto. Contudo, nos últimos anos tenho sonhado mais, e meus sonhos me
fizeram buscar conhecimento e essa busca me conduziu 'A Teoria do Sucesso
Irrestrito - S=c.p² (Sucesso é igual ao conhecimento multiplicado pela
perseverança ao quadrado)'.
Foi um feixe de luz (http://jrmilton.blogspot.com.br/2012/04/um-feixe-de-luz.html)
que atingiu minha mente e desde então tenho me esforçado não apenas para
adquirir conhecimento, mas para de alguma forma levar conhecimento até as
pessoas. E a forma que encontrei para fazer isso, foi à internet. Ela está intimamente ligada a minha profissão e
incrivelmente acessível para um grande número de pessoas.
Durante este último
hiato das publicações do Blog, criei uma página no 'Internet Archive', onde
comecei a compartilhar uma diversidade de documentários que encontrei na
própria internet e que são excelentes
fontes de conhecimento. Parafraseando a paráfrase de Mazzeo sobre Marx, as
pessoas têm que ter pelo menos o direito de poder conhecer as coisas.
Estes documentários reúnem
temas desde biografias, conceitos tecnológicos e científicos, até história do
Brasil e economia, constituindo um universo bem variado de assuntos. Os
documentários podem ser acessados em http://archive.org/bookmarks/jrmilton
e espero que contribuam para aumentar sua sede de saber, pois como escreveu
Dídimo sobre as palavras do Mestre dos mestres: "Todo aquele que busca,
continue buscando, pois encontrará e ao encontrar, sentir-se-á maravilhado e ao
sentir-se maravilhado reinará no mundo". Ser autodidata e apostar em uma
educação continuada são a chave para o sucesso nesta era que vivemos, a Era do
Conhecimento. Por isso não se prenda a uma educação formal, vá além, pois o verdadeiro conhecimento
está na realização, na experienciação; os títulos formam, as experiências INformam
– dão forma, desenvolvem, agregam.
Para diversificar
ainda mais as coisas e ponderar nossa vida contemporânea, o Mirtu's Blog
apresenta o texto de uma entrevista de Antonio Carlos Mazzeo; em que ele explica
os principais conceitos da sociologia de Karl Marx e faz uma analise de como o
filósofo enxergaria o mundo de hoje. Antonio Carlos Mazzeo é doutor em História
Econômica pela USP - Universidade de São Paulo e é professor de ciências
sociais da UNESP de Marília. Estuda o comunismo, o capitalismo e a burguesia no
Brasil e é especialista em Karl Marx.
O texto desta
entrevista é uma contribuição mais do que especial de Helbia Araújo – que trabalhou
com esmero para termos acesso a esse conhecimento.
Segundo Marx
A
história não tem fim, a história é um processo em permanente movimento, e
fundamentalmente a história é feita pelos Homens. Todas as verdades são históricas, elas valem
por um momento, elas não valem nem para o passado, nem para o futuro, você
explica a realidade a partir dela mesma.
O Homem como produto
de si mesmo
Marx
se propunha antes de tudo, um crítico do pensamento idealista e da filosofia
idealista, exatamente por isso ele incorporou na sua teoria social não só a
crítica à filosofia de um lado, mas também incorporou de outro, a crítica à
economia política, tentando articular tanto uma visão de destruição das velhas
formas ideológicas – que ele chamou de ideologia, no sentido de concepções
idealizadas do mundo – e ao mesmo tempo das formas de organização econômica da
sociedade. Essa articulação é o que ele chamou de articulação dialética da
sociedade, a infraestrutura e a superestrutura. A infraestrutura e seu plano
econômico, a superestrutura e seu plano ideopolítico, e é essa articulação
dialética que conforma a sociedade. Por isso, não é usual dizer a rigor, que
Marx tenha sido um sociólogo, ainda que a sociologia possa utilizar o seu método
analítico para fazer os seus estudos sobre a sociedade.
Por
conta de seu método inovador, se pode dizer que o método de Marx tem um aspecto
revolucionário, nucleado na crítica das velhas formas analíticas, porque as
velhas formas analíticas ocidentais provinham da tradição grega, elas vinham da
grande tradição do pensamento clássico grego, dos métodos fechados, das formas
quase que estruturadas em começo, meio e fim de análise dos processos sociais; e
Marx disse: "depois que consegui estruturar o método superando a dialética
de Kant e a dialética de Hegel"
– e ele tinha muita identidade com essa dialética de Hegel – "eu consigo
entender que não há mais verdades absolutas", inclusive Engels seu grande companheiro
de trabalho disse em um texto clássico, analisando o que eles tinham feito ao
longo da vida, um texto que ele escreveu quando Marx já havia morrido, em que ele
disse que a grande novidade do pensamento é que tudo passa a ser absoluto e
relativo ao mesmo tempo. Por quê? Porque na verdade, todas as verdades são
históricas, elas valem por um momento, elas não valem nem para o passado e nem
para o futuro, você explica a realidade a partir dela mesma, não se pode usar o
modelo do passado para avaliar o modelo do presente, e não se pode usar o
modelo do presente para avaliar o futuro, porque o futuro só será avaliado ao
longo do seu próprio processo de construção, então não há mais fim da história,
a história não tem fim, a história é um processo em permanente movimento e
fundamentalmente a história é feita pelos Homens, pela humanidade.
Marx é o resultado de
um processo histórico, se usarmos o próprio método de Marx, não há Marx sem Descartes,
sem Espinosa, sem Kant e sem Hegel, sem os Iluministas. Marx é uma síntese de
um processo de construção, de um pensamento que nasce com a revolução burguesa,
com a construção do capitalismo, e Marx é uma síntese não só desse processo,
diga-se heroico, do período heroico da construção do capitalismo, do chamado
racionalismo burguês. Marx se apresenta como uma ruptura e uma continuidade do
racionalismo burguês. Continuidade em que sentido? Ele não nega em nenhum
momento o racionalismo que aparece com a revolução burguesa, que aparece com a
sociedade capitalista, mas de outro lado ele nega as formas ideológicas e
materiais que se constroem a partir do capitalismo, ou seja, ele passa a
apontar as contradições que o capitalismo possuí, ele passa tentar demostrar
que o capitalismo também é histórico e que há uma possibilidade histórica de
sua superação.
O
trabalho, segundo Marx
Marx pensava o trabalho
como o centro, não só da sociedade, mas como essência humana, ou seja, que 'trabalho'
ele está dizendo? Não é esse trabalho cotidiano, que as pessoa se levantam de
manhã, vão para o trabalho, batem o ponto e voltam. A noção de 'trabalho' de
Marx, ele chamou de práxis, em que há uma conexão de fazer e de pensar; ele concluiu
que o ser humano é produto de sua própria obra. Cada ação humana corresponde à
construção de uma forma de pensamento sobre essa ação, então ele chamou esse
conjunto da ação humana de práxis, esse conjunto da ação humana, que não
somente age, mas age e pensa; essa conexão dialética entre a ação e o
pensamento, e a noção do trabalho que é o núcleo de sua concepção de
humanidade, ele colocou o homem como produto de si mesmo; portanto o trabalho é
o criador do homem, o homem sem trabalho, não é homem.
Todas as formar
sociais humanas ao longo da história, se constituem através de formas
históricas de trabalho. O que isso quer dizer? A cada momento da organização da
humanidade, da objetivação dos seres sociais, das sociedades humanas, o trabalho
ganha formas diferentes; se nós pensarmos numa sociedade arcaica, tribal, ali teríamos
um trabalho comunitário, em que a divisão social do trabalho é feita por sexo,
porque as formas de propriedades são coletivas, então há uma divisão sexual do
trabalho. O homem caça, pesca, enfim, guerreia e a mulher planta, constrói e
tece cestos, tecidos, cuida das crianças, etc. Essas sociedades são
comunitárias, elas têm uma divisão do trabalho em que não há hierarquização da
forma de produzir. Na sociedade onde se tem propriedade privada, e onde já se
tem embriões de formas de estado, obviamente se tem a divisão de classes, ou
castas, e aí o trabalho também vai estar organizado de acordo com a forma e
estrutura produtiva, e com as formas de propriedade; então, se imaginarmos uma
sociedade palacial, vamos pensar, Babilônia, do tempo de Hamurábi ali era uma sociedade
camponesa, onde os camponeses trabalhavam suas próprias terras, mas pagavam um
tributo ao estado, e o estado tinha seus escravos estatais. Os camponeses eram
livres e podiam pagar esse tributo ou com o trabalho, ou com espécie, tanto era
assim na Babilônia quanto no Egito antigo, onde o rei do estado fazia uma
intermediação entre o Deus daquela sociedade e os homens. Então essa era outra
forma de organização do trabalho.
Numa sociedade
escravista grega, por exemplo, dos gregos antigos, havia uma propriedade
privada do escravo, então o escravo trabalhava para um senhor, onde se tinha
toda uma estrutura escravista que garantia as formas de propriedade, que
garantia inclusive as formas politicas; e a escravidão garantiu o surgimento da
democracia, como exemplo, no capitalismo o trabalho é livre, o trabalhador
vende a sua força de trabalho e o empresário capitalista compra a força de
trabalho. É uma sociedade baseada na propriedade privada, nos meios de produção,
e é uma sociedade fundamentalmente organizada em função da produção de
mercadoria, então obviamente isso implica numa necessidade de um trabalho livre
e de um trabalho transformado em mercadoria. Então, obviamente, quando Marx
analisou a construção da categoria 'trabalho', ele analisou que toda forma
social tem uma forma histórica de trabalho e no capitalismo como elemento
central, é um trabalho livre e a venda da força de trabalho é o que move a
estrutura social, mas não só isso, esse trabalho produz, e a produção desse
trabalho são mercadorias, que são destinadas ao mercado, então esta dinâmica do
mercado passa a absorver todas as relações sociais, tanto as relações do
trabalho como outras formas de relação, se imaginarmos, como exemplo, que seria
impensável para o grego de Atenas no Século V pagar escola para seus filhos, tanto
é verdade, que quando isso aconteceu, houve uma grande reação de Sócrates e de
Platão; Sócrates inclusive foi condenado porque passou a fazer críticas muito
vigorosas às formas mercantilizadas da educação, e ele questionou: 'Como é que eu posso comprar e vender
educação, se a educação é resultado de um processo social?'. E Marx pensava
mais ou menos isso, ele pensou: "Poxa, a educação é resultado de uma construção
social, ela é produto social, como é que eu posso transformar um produto social
em mercadoria".
Então isso é uma das
formas de compreensão de Marx, daquilo que ele chama de mercantilização da
vida, e Marx ainda chegou a dizer que, não só a sociedade capitalista mercantiliza
a vida, como fetichiza a vida através da mercadoria, como se a mercadoria
ganhasse uma dimensão maior do que o seu criador, é como se você tivesse aquela
relação entre criatura e criador, sendo que a criatura passa a ter uma dimensão
maior do que a do criador. Como no filme Blade Runner - O Caçador de Andróides,
em que o androide é uma mercadoria, só que a mercadoria quer se humanizar, e os
humanos estão tão mercantilizados que não entendem que o androide não quer mais
ser mercadoria, na medida em que ele é um arremedo de ser humano. ele quer
também ter uma vida de ser humano, mas não consegue, é isso que Marx chama de
fetiche da mercadoria, quer dizer, a sociedade tem essa estrutura e o trabalho
no capitalismo, diferentemente de outras formas sociais, por exemplo,
diferentemente da idade média, o trabalhador capitalista é desprovido dos bens
de produção, porque os meios de produção estão todos na mão do capitalista, o
trabalhador tem apenas sua força de trabalho, ele vende sua força de trabalho,
então ao vender a sua força de trabalho ele passa a ter uma parte de seu
trabalho expropriado.
Então veja qual é a
lógica; se o trabalho é a essência humana e se o homem é produto do seu
trabalho, quando o ser humano que vai a uma fábrica vender sua força de
trabalho e tem expropriado uma parte dessa força de trabalho, que não é paga,
Marx chama isso de alienação do trabalho humano, então uma parte do seu
trabalho está alienada, por quê? Porque quando a gente pensa no trabalho humano,
nós pensamos no resultado do trabalho, isso Marx chamou de processo de produção
de mais valia, por exemplo, se eu faço um contrato com um capitalista, eu vou
trabalhar oito horas por dia e vou receber R$ 10,00 por mês. Nessas oito horas
por dia, em quatro horas de trabalho, eu já pago meus R$ 10,00 ao qual eu
recebo, e trabalho mais quatro horas que são mais R$ 10,00 porque eu estou
produzindo, só que esse mais R$ 10,00 não vem pra mim, vai para o capitalista. E
Marx diz que isso é uma expropriação do trabalho humano, e essa expropriação do
trabalho humano, foi chamada de mais valor, ou mais valia e, portanto, é uma forma alienada de relação do
trabalhador com a produção.
Para Durkheim, o
trabalho faz parte da estrutura orgânica da sociedade, e ele se preocupou tanto
com isso, que escreveu um livro chamado "A Divisão Social do
Trabalho", exatamente mostrando que essa divisão social do trabalho está
dentro da organicidade da sociedade, faz parte da estrutura orgânica da
sociedade, mas para Durkheim o trabalho não é a essência do homem, não está
conectado com a essencialidade humana. Para Weber, o trabalho é até mais penoso,
a noção do trabalho para Weber é uma obrigatoriedade, é uma compulsão social,
mas também não há em Weber a noção, a ideia de que o trabalho seja a essência
humana, a única formulação que vai chegar a essa ideia de que o trabalho é a
essência humana, que a essencialidade do homem é o trabalho, é Marx.
Produção e divisão de
classes
Para analisar a
divisão de classes vamos pensar que na sociedade anterior – pois o capitalismo
é histórico, não que ele tenha sempre existido, antes do capitalismo existiram
outras formas de organização do trabalho –, então vamos pensar na idade média,
daquilo que se chama de feudalismo, o artesão, ele tinha os meios de produção;
o que são os meios de produção? São os instrumentos de produção. Então se você
pensasse em um sapateiro, ou em alguém que trabalhasse com couro, se você
dissesse para ele: "Eu quero uma cela de cavalo", ele diria: "Tudo
bem", então ele iria onde se abatiam os bois, comprava a pele, ou então iria
a um curtume, comprava a pele do curtume, chegava em casa, cortava essa pele,
montava toda a cela com seus instrumentos, costurava-a e entregava essa cela
pronta, esse é o artesão.
O que acontece no
capitalismo? Não é mais assim. Primeiro o trabalhador não tem mais os meios de
produção, ou seja, não tem os instrumentos de produção, o trabalhador vende só
a sua força de trabalho. Chego e digo: _ Eu quero trabalhar.
_ Pois não, o que o
senhor sabe fazer?
_ Eu sou marceneiro.
Então, não tenho a
madeira, não tenho o machado, não tenho a serra, não tenho a plaina, não tenho
nada. Chego na fábrica, a fábrica me fornece tudo, todos os instrumentos de
produção estão lá, você então pega a sua capacidade de trabalho, e utiliza os
instrumentos e produz, isso é que são os meios de produção.
A divisão de classes é
resultado de uma sociedade de classes, ou seja, se eu vendo a minha força de
trabalho e alguém compra a minha força de trabalho; significa que quem está
comprando, não compra uma força de trabalho, compra várias forças de trabalho,
então isso significa que a sociedade está dividida entre aqueles que detêm os
meios de produção – os instrumentos de produção – e aqueles que não detêm os
meios de produção.
Em geral na sociedade
de classes, a maioria não detém os meios de produção, e a minoria detém os
meios de produção, isso é o que a gente chama de sociedade capitalista, claro
que ela não é dividida só em duas classes, ainda que sejam as duas classes
fundamentais, o que é chamado de proletariado – os trabalhadores assalariados –
e os empresários, uma burguesia, que são aqueles que detêm os meios de
produção. É uma sociedade em que você tem pequenos burgueses, que se têm
camponeses, ainda que hoje em dia esses estejam praticamente desaparecendo, e
dentro da categoria da classe dos burgueses, você tem aqueles que detêm a
indústria, aqueles que detêm a produção agrícola, aqueles que detêm o capital
financeiro. Se bem também, que no mundo de hoje há uma tendência de
concentração de indústria e capital, e a própria indústria se alargou de tal
forma, que também não há mais diferença entre o que é produzido no campo e o
que é produzido na cidade, porque hoje no campo, não temos mais uma fazenda
tradicional, temos uma agroindústria, e no campo a tendência é termos a
presença de grandes proletários rurais, que são trabalhadores assalariados no
campo, são aqueles que vão colher cana de açúcar, que vão colher varias
produções agrárias, que vão cuidar da criação de animais e assim por diante,
quer dizer, na colheita do plantio, esses trabalhadores também não detêm mais a
terra, também não detém mais os meios de produção, porque a terra no capitalismo
é um meio de produção.
Então de novo esse
trabalhador não tem mais nada, a não ser a sua força de trabalho, então a
sociedade capitalista é dividida em classes nesse sentido, porque classes estão
inseridas num processo produtivo de maneiras diversas, e no mundo atual, nesse
capitalismo contemporâneo, as inserções são de diversas formas, que não alteram
o seu conteúdo, mas são feitas de diversas formas, como exemplo, mesmo que você
pense hoje num pequeno produtor, uma pessoa que tenha uma pequena porção de
terra, ainda ele é proprietário do seu meio de produção, ele também não está
tão independente como estaria 100 anos atrás, porque esse proprietário de um
pequeno pedaço de terra – vamos supor que produza milho e leite –, o que
acontece é que ele vai ter que vender essa produção de milho, e vamos supor que
ele tenha uma boa produção, ele vai ter que vender essa produção de milho para
quem compre, para quem tem interesse no trabalho incomum, pensemos em uma
grande empresa de cereais, ela vai estar interessada em comprar uma produção de
milho desse pequeno proprietário, e uma grande empresa de produtos lácteos vai
também estar interessada na produção do leite que ele produz e obviamente o preço
do leite e do milho que ele produz não serão dados por ele, serão dados pela
empresa que está comprando a produção dele e de outros pequenos proprietários,
então apesar dele ser proprietário desse meio de produção, ele está subordinado
as formas de hegemonia do processo produtivo dos grandes conglomerados
capitalistas, que hoje tendem a se fundir entre o capital financeiro e o
capital industrial.
Isso é uma
proletarização não clássica, não é aquele operário clássico, que vai à fábrica,
mas de certa maneira ele está proletarizado, porque ele está subordinado a um
grande processo produtivo que começa com a aquisição da matéria prima, no caso
o milho, ou o leite, que acaba nos floquinhos de milho, como exemplo.
Infraestrutura
e Superestrutura
Marx usou os termos
infraestrutura e superestrutura em um famoso prefacio de um primeiro livro que
escreveu sobre o capital, que é a "Contribuição para a Crítica da Economia
Política", é um prefacio de 1959, o famoso prefácio de 59 – como se
costuma dizer. Neste prefácio, Marx tentou ser mais ou menos didático, então
ele escreveu que a sociedade é organizada numa infraestrutura, onde está a base
econômica, e numa superestrutura, onde está uma base ideológica, ideo-politico
jurídica.
Obviamente a teoria
Marxiana é muito mais complexa do que isso, mas é uma forma de didatizar o que
ele pensou em 59. Obviamente ele já tinha escrito alguma coisa muito mais
complicada que não era para se publicar, ele escreveu para própria reflexão em
manuscritos que foram encontrados na década de 30 do século XX, que são
chamados de manuscritos econômicos 1844. Esses manuscritos tendem a fazer uma
análise muito mais complexa sobre essas conexões da sociedade. Mas se nós
fossemos usar os termos infraestrutura e superestrutura, poderíamos dizer que
eles só podem ser explicados se forem analisados de maneira concomitantes e
conectados, não dá para analisar ou a infraestrutura, ou a superestrutura, porque
aí se perde aquilo com que Marx estava preocupado, com a totalidade. Não dá
para analisar nenhum processo social se você não entender a totalidade, agora o
que é a totalidade? É tudo? Claro que é impossível você analisar tudo. Totalidade
são as conexões em que se realizam os complexos que a sociedade vai criando. Seria
uma conexão de complexos de complexos, o que isso quer dizer? É que a sociedade
não é só econômica, a sociedade não é só cultural, a sociedade não é só
ideológica, ela não é só religiosa, ela é tudo, ela é uma articulação
simultânea de múltiplas determinações. Daí uma frase clássica de Marx, também
desse prefacio de 59, que vale a pena ser transcrita. É uma frase em que ele fala
sobre o concreto, no sentido de que a sociedade em sua complexidade, é algo concreto,
ele diz: "O Concreto é concreto, porque é síntese de múltiplas
determinações, a unidade da diversidade". Quer dizer, só podemos entender
a totalidade de um complexo social, se entendermos esse complexo como resultado,
ou como unidade de uma diversidade, obviamente essa diversidade não se
equilibra harmonicamente como analisava Durkheim. Pois para Durkheim a
sociedade é harmônica, e para Marx a sociedade é um conjunto total de
contradições, ela se equilibra pela contradição, não se equilibra pelo
harmônico. Para Marx a infraestrutura seria a base econômica e a superestrutura
seria a base ideo-politica jurídica, mas isso é uma separação que reduz o
conjunto do pensamento de Marx, poderíamos usar isso apenas como aspecto
didático.
O
valor da mercadoria
O
capitalismo como toda forma social, possuí uma ideologia, num sentido de um
conjunto de ideias que se auto explica, em geral há uma explicação falsa,
fantasiosa de que o que cria o valor da mercadoria é o mercado, mas Marx nos
explica bem que a mercadoria é o resultado do processo de trabalho, isso quer
dizer, que o valor de uma mercadoria é determinado pelo tempo de trabalho
necessário para produzir essa mercadoria, na mercadoria está contida não só o
tempo de trabalho, como o próprio trabalho do trabalhador, morto e
materializado, ou seja, quando você olha uma mercadoria; você olha um telefone
celular, ele não tem vida própria, ele é produto de um ser humano e dentro
desse celular tem o trabalho materializado de um ser humano, e esse trabalho,
essa parte do trabalho, ela é uma parte essencial do valor da mercadoria, ou
melhor, é a parte fundamental do valor da mercadoria. A mercadoria, seu valor,
é determinado pelo tempo que o trabalhador leva para produzi-la. Dentro desse
valor está a mais valia e obviamente
também nesse processo de produção, há uma parte do trabalho que paga o próprio
trabalho do trabalhador, mas é a menor parte.
Cliente: Mas se estes relógios custam dez dinheiros para serem feitos, e você os está vendendo pelo mesmo preço, de onde vem o seu lucro? Relojoeiro: Nós temos que consertá-los. |
Salário,
Preço e Lucro
O capital é a obra da
vida de Marx, ele morre sem terminar o capital, e na verdade, ele redigiu mesmo
e fez a revisão, só do primeiro volume, os outros dois volumes foram compilados
por Engels e publicados postumamente.
O "Salário,
Preço e Lucro" é uma forma didática que ele encontrou – porque Marx não
era um acadêmico, ele não era um professor universitário, ele era um militante
do movimento operário, claro que ele fazia parte do seu núcleo intelectual,
porque ele não era o único intelectual do movimento operário, ele fazia parte
de um núcleo intelectual do movimento operário, junto com Engels, mas junto também
com outros pensadores, militantes, e onde todos eles produziram num determinado
momento de suas vidas não só uma polemica teórica para tentar obviamente paramentar
o movimento, organizar e dar diretivas para o movimento operário, mas também
para tentar entender o próprio processo dialético do capitalismo e do movimento
operário – então, "Salário, Preço e Lucro" é um texto didático, em
que ele explica a diferença entre o preço da mercadoria, o valor da mercadoria
e o lucro da mercadoria, é uma tentativa de divisão didática do complexo no
processo produtivo. Para Marx o processo produtivo é um processo articulado,
ele não era só a fábrica, não era só o momento da produção, mas era todo um
conjunto que ele chamou de produção, circulação, distribuição e consumo, então se
pode dizer que o processo produtivo é dividido em quatro etapas que se
articulam dialeticamente, produção, distribuição, circulação e consumo.
Uma sociedade
pretendida e possível segundo a sua avaliação, era uma sociedade em que os
produtores vivessem de forma associada, o que ele chamou de sociedade dos
produtores associados, nos manuscritos de 44, ou comunismo, por isso que se
costuma dizer também que a visão de Marx, era uma visão da possibilidade que o
capitalismo criaria para sua própria superação, ou seja, o desenvolvimento de
forças produtivas, o desenvolvimento cientifico, o desenvolvimento tecnológico,
criariam as condições, primeiro de compreender a relação entre o homem e a
natureza, porque vale lembrar que para Marx, na sua concepção de ser humano, o
ser humano possuía dois corpos, um corpo orgânico e um corpo inorgânico. O
corpo orgânico é o corpo das pessoas, o corpo inorgânico era a natureza, ele disse
que é impossível que você pense um ser humano que viva fora da natureza, ele
tem que depender do oxigênio, da pressão atmosférica, da agua, enfim, do sol,
porque ele é um ser, ele tem um aspecto biológico, só que o ser humano também
não é um ser naturalista, ele é um ser que transforma a natureza, ele cria um
mundo humano, um mundo em que a presença do seu trabalho cria as suas formas de
existência, e mais do que isso, o olhar humano é inclusive olhar para a
natureza e humanizar a natureza, ou seja, dar a natureza uma intensão humana
que ela não tem; como diria Marx, o capitalismo na verdade seria a ultima forma
– que ele chamou – de "pré-história da humanidade", em que sentido? É
a ultima forma social em que o homem para poder viver, explora o próprio
homem.
Marx disse ainda, que
com os recursos e as condições que capitalismo cria, é possível superar esta
forma de exploração do homem pelo próprio homem e se criar uma sociedade de
produtores associados, onde para se viver não é necessário explorar o trabalho
do outro, e mais, com os recursos tecnológicos – e isso ele disse no século
XVI, agora imagine, pois estamos no século XXI – e científicos que o
capitalismo cria, você diminui o tempo de reprodução da vida. Porque o que é o
trabalho? É a reprodução da vida, então o tempo de se estar na fábrica, ou no
escritório deveria ser reduzido, e o seu tempo de lazer, o seu tempo para si
mesmo e para os outros deveria ser muito maior, então seria uma sociedade
baseada em outra lógica que não essa lógica que nós conhecemos, por isso é
importante acrescentar que a humanidade não viveu nenhuma experiência
comunista, o que se viveu até hoje foram experiências socialistas, e vamos
analisar isso do ponto de vista de Marx, que há uma diferença entre o
socialismo e o comunismo para Marx.
Marx explica que o
socialismo é a primeira fase do comunismo, onde se prepara a transição do
capitalismo para o comunismo, e isso também tem uma implicação importante
politica e filosófica, ele diz que a humanidade ao longo de milênios se
acostumou com o estado, com as formas de poder, com divisão de classes, ou
estamentos, ele diz que para desacostumar a sociedade ao estado, ao poder, ao
exército, a polícia e as normas opressivas e formas de alienação da sociedade,
principalmente o estado como uma forma de alienação, porque o estado intervém e
tira do ser humano a sua autonomia; é necessário que você tenha um período de
transição que ele chama de socialismo. Onde na verdade o estado se prepara para
a sua auto dissolução, e nós não vivemos isso ainda, a própria experiência do
socialismo se se pensar na Revolução Russa, que é a primeira grande revolução
socialista em 1917, em vez de se preparar para dissolver o estado, ela criou um
estado maior ainda, muito ao contrário do proposto por Marx; ela não dissolveu
o estado, então obviamente essa experiência socialista apesar de ter tido
alguns elementos de socialização da produção, de distribuição social da mais valia, de distribuição social de
cultura, de acesso à educação, de acesso à saúde, de acesso à habitação, etc.,
também por outro lado, não vivenciou uma ampla liberdade individual, porque
essas sociedades socialistas que existiram, tiveram grandes problemas de
democracia interna, acabaram se transformando em ditaduras de partido e não em
sociedades onde o centro seria a própria sociedade, isso significa que são
experiências curtas em termos de história, são mais ou menos oitenta e sete, ou
oitenta e oito anos de experiência socialista, contra quatrocentos anos de
construção capitalista; na verdade a ideia de comunismo de Marx está muito mais
realizável hoje do que se nós pensarmos no início do Século XX.
No Século XXI há mais
capacidade civilizatória, tecnológica, cientifica e cultural para se pensar em
uma sociedade nos moldes que Marx tinha pensado, uma sociedade de
solidariedade, de produtores associados, sem estado, auto gerenciada, uma
sociedade em que não há nenhum tipo de opressão que não seja decidida
coletivamente pelas pessoas.
A
revolução como caminho
Marx também fazia
muita questão de não ser adivinho, então qual era a experiência de Marx? Qual
era o laboratório de Marx? Era a história, aquilo que a humanidade tinha experienciado,
então o que ele tinha como referencia? Todas as transformações humanas, todos
os embates contra qualquer tipo de opressão, sempre acabaram em confrontos duros.
A própria burguesia quando começou a confrontar o poder feudal, ela confrontou
o poder feudal de diversas maneiras, inclusive no final de forma armada, é só
pensarmos na Revolução Inglesa do Século XVII, a revolução de Cromwell foi uma revolução de confronto
armado, exercito popular de um lado, exercito aristocrático do outro, a
Revolução Francesa foi uma grande convulsão, foram confrontos armados, e a
Revolução Americana, que também foi uma revolução burguesa, revolução
anticolonial, revolução democrática, burguesa e anticolonial, é uma revolução;
os exércitos anticoloniais de um lado, os exércitos coloniais e ingleses do
outro, confrontos armados, quer dizer, Marx olhou e disse, qual é a forma de
você confrontar a opressão a não ser com o poder, o contra-poder daqueles que
são oprimidos, e antes das revoluções burguesas as outras revoluções, sempre se
confrontando na força, porque quem detém o poder não vai entregar o poder de
graça.
E
se Marx visse a sociedade hoje
Marx ficaria
espantado por dois motivos; primeiro ele diria o seguinte: "Tudo aquilo
que eu avaliei, que eu analisei, está acontecendo. A mercadoria se transformou,
não é mais um fetiche mais é uma reificação, o mundo vive uma reificação, todas
as relações sociais se mercantilizaram", imagine Marx caminhando pela
Avenida Paulista e olhando as revistas de mulheres nuas, ele diria: "Está
aí um ser humano que virou mercadoria de vez; se vende pessoas nas ruas".
Ele diria que a mais valia se realiza
hoje de uma forma brutal, de que é uma concentração, de que aquilo que ele
dizia que era uma tendência,a aconteceu, a fusão do capital financeiro com o
capital industrial, que é o capital monopolista do mundo contemporâneo.
E também diria o
seguinte: "Poxa vida, essas experiências socialistas falharam e falharam
muito". Porque Marx era um crítico, ele dizia que não há verdade absoluta
tudo é relativo e tudo é absoluto ao mesmo tempo, tudo que é sólido se
desmancha no ar, essa é uma frase de Marx, é uma frase de um manifesto
comunista. Marx faria uma dura critica as experiências socialistas, como ele já
fez na comuna de Paris, que foi a primeira tentativa de tomada do poder pelos
trabalhadores em Paris em 1871, e a primeira forma didática que Marx usou para
mostrar que a tendência de se construir o poder dos trabalhadores, é
transformar os trabalhadores em classe dominante – porque até então ele não
havia feito essa formulação, porque ele dizia o seguinte, nos vamos tirar a classe dominante, desmontar a sua estrutura de poder –,
depois da experiência da comuna de
Paris, ele diz que só é possível desmontar a estrutura de poder se a classe
trabalhadora, se os oprimidos, os trabalhadores, os proletários e seus aliados,
os camponeses, se transformem em classe dominante. Um pouco aquela ideia que
vai estar presente em textos muito específicos de Marx, daquilo que mais tarde
vai se teorizar muito na ditadura do proletariado.
A ideia da ditadura
do proletariado tem muito pouco de ditadura para Marx, porque a ideia de
ditadura do proletariado seria os trabalhadores se constituírem como classe
dominante para combater a ditadura do capital, uma sociedade que é comandada
pelo capital, comandada pela mercadoria, você vende sua força de trabalho, na sua
força de trabalho o preço não é dado por você, mas é dado pelo patrão, e você
tem que comprar tudo, tem que pagar tudo, você está todo subordinado a produção
de mercadorias, é uma ditadura, quer dizer, como eu me contraponho contra a
essa ditadura? Com a ditadura dos trabalhadores.
Mas ao mesmo tempo
ele diz: "A ditadura do proletariado emancipa não só o proletariado, mas
emancipa a humanidade, eu não estou preocupado; a minha teoria não é uma teoria
da vingança", e ele fez varias polemicas sobre isso, "não estou
pregando a vingança, nós vamos tomar o poder e vingar de quem nos oprimia",
ele falou, "isso só vai recolocar o sistema de opressão, e eu só posso
pensar em emancipar a humanidade" – emancipar do que? Da opressão? –
"se eu libertar os oprimidos e libertar os opressores da opressão, ao
fazer a revolução socialista rumo ao comunismo, eu só posso fazer essa revolução
se eu tiver como perspectiva a emancipação de toda a humanidade".
Para Marx a ideologia
era uma falsa consciência, ele escreveu junto com Engels, um livro chamado "A
Ideologia Alemã". No subtítulo fica muito mais clara a critica da
ideologia em geral e em particular a ideologia alemã. O que quer dizer isso?
Ideologia para Marx era uma visão idealizada do mundo, era uma falsa
consciência, então ele fez uma crítica da ideologia em geral, ou seja, do
conjunto do pensamento ocidental e particularmente do pensamento alemão, nas
figuras de Bruno Bauer e Max Stirner, e de outros pensadores idealistas, todos
eles advindos da corrente da esquerda hegeliana,
então, por exemplo, para Marx ideologia significava uma compreensão falsa da
humanidade, daí esta dureza dele em combater as ideologias; Marx era caustico
em relação à questão ideológica.
Críticas
ao pensamento de Marx
Algumas críticas ao
pensamento de Marx são pertinentes e outras são infundadas, e algumas ainda são
produtos de pessoas que nunca leram Marx e ainda assim fazem criticas a Marx.
Comecemos por aquelas
que não têm fundamento. Há todo um núcleo no pensamento de Marx que tenta
articular a realidade com a teoria, nenhuma formulação de Marx está
desconectada do mundo real, Marx era rigoroso nessa questão, tinha o espirito cientifico
muito aguçado e uma rigorosidade conceitual muito forte, ele não inventava
nada, tudo aquilo que ele descrevia eram dinâmicas que ele via no mundo real e
ele mesmo dizia, "não dá pra fazer nenhuma abstração se essa abstração não
tiver como fundamento a realidade".
Segunda questão da
critica de Marx. Marx vale para o século XIX, não vale para o século XX e nem
para o século XXI, isso é também uma incorreção analítica na medida em que,
quando Marx analisa o capitalismo – a dinâmica do capitalismo –, ele demonstra,
e a sua teoria social demonstra que essa dinâmica não se alterou no seu
fundamento, quer dizer, o capitalismo continua sendo uma sociedade movida pela
produção de mercadorias, continua sendo uma sociedade que compra e vende força
de trabalho, continua sendo uma sociedade baseada na propriedade privada dos
meios de produção, portanto a estrutura fundamental do capitalismo continua
funcionando, e existe ainda outra crítica que a teoria de valor de Marx não é
valida, quer dizer, fica muito difícil dizer que a teoria de valor de Marx não
é valida justamente numa sociedade que é baseada na produção de mercadorias e
essas mercadorias geram o movimento não só do capital que ela produz, e esse
próprio capital criou hoje uma dimensão tão grande que também se transformou na
mercadoria, num grande fetiche; então, fica muito difícil fazer em geral essas
três criticas básicas a Marx.
O que é pertinente?
Pertinente é dizer o seguinte, muitas das análises de Marx estavam datadas,
obvio, porque Marx nunca se propôs a ser 'bidú', ele se propôs a ser um
analista da sociedade, então obviamente ele não poderia analisar aquilo que ele
não viveu, ele morreu no século XIX, finais do século XIX. Você pode dizer que muitas
das conexões que Marx fazia da analise das classes sociais hoje já não se
sustentam por si só, claro, mas se parte do pressuposto de Marx para se
entender o mundo de hoje. O que é válido em Marx? Sua critica ao sistema de
funcionamento do capitalismo, ela está absolutamente de pé, e fundamentalmente –
o que é importante ressaltar –, o essencial de Marx é o método; método que
tenta aprender o mundo em seu movimento, em suas contradições, em suas
complexidades, Marx jamais criaria um tipo ideal como Weber criou, ou um tipo
social como Durkheim criou. Para Marx todas as categorias analíticas são
históricas, portanto elas têm data de validade também, só vale falar de mercadoria
no capitalismo, se eu entender a função da mercadoria que ela tem no
capitalismo, porque a mercadoria sempre existiu, o próprio Marx disse isso;
agora se eu tenho essa mercadoria, por exemplo, no mundo antigo, no mundo dos
Romanos, dos Gregos, ela tinha um valor de uso, eu comprava essa mercadoria e ela
tinha um valor também, porque ela também tinha trabalho morto, materializado do
ser humano, mas eu comprava essa mercadoria para consumir, eu precisava de um
casaco e comprava um casaco para vestir, por sentir frio, no mundo do
capitalismo a mercadoria ganha outra dinâmica, aí Marx explica que, aqui ela
tem outra característica e o mercado que se tem no capitalismo não é o mesmo
mercado que se tem no mundo antigo. Poderiam perguntar o seguinte: "Poxa,
mas os fenícios não eram grandes comerciantes do mundo antigo? A Grécia não era
uma grande 'talassocracia'" – que significa uma grande potencia marítima
comercial? Era, mas o quê que se circulava ali? Mercadorias? Sim. Mas era o
excedente da mercadoria, porque antes de qualquer coisa, se produzia mercadoria
para o consumo, para eu comer, para você comer, para se vestir. O que sobrava
circulava e se trocava.
Mercado de Flores. (Tulipomania?) |
No capitalismo se
produz essencialmente para o mercado, então ela tem outra característica, então
não se pode colocar o mercado do mundo antigo com o mercado do mundo
contemporâneo, são coisas diferentes. O método de Marx, é muito rígido, é muito
rigoroso, quer dizer, não dá para analisar nenhuma categoria fora do seu tempo
e de seu espaço histórico. Isso é o que se preserva de Marx no aspecto
fundamental, no seu método, a sua capacidade de aprender as dinâmicas e as
complexidades das dinâmicas sociais, suas articulações e sua historicidade.
Educação
Marx não tem nenhum
estudo sistematizado sobre educação, mas ele dá algumas dicas. A dica
fundamental é de que a ação humana é uma ação educativa permanente, quer dizer,
a ideia da práxis – quer dizer, fazer
aprendendo e aprender fazendo, a conexão de que o ser humano é produto de si
mesmo, tem uma intrínseca noção pedagógica, de que o homem se auto educa,
através de sua ação. Então ele diz que nas sociedades em geral, toda a
estrutura educacional visa legitimar a sociedade existente, isso aconteceu no
passado e no capitalismo não é diferente, só que o capitalismo é a primeira
forma econômica da humanidade que funde de maneira estreita: produção,
conhecimento e o trabalho.
Isso, pois a ampla
produção de mercadorias exige uma permanente criação de recursos técnicos e
científicos para poder aumentar o processo produtivo, isso gera obviamente
contradições; a educação não é meramente uma educação como era no passado,
doutrinária, ainda que o doutrinarismo continue presente no capitalismo, mas se
você pensar que na idade média toda educação era somente doutrinária, você
estudava somente a partir dos núcleos e dos parâmetros do cristianismo, isso
desaparece no capitalismo, quer dizer, você vai ter o surgimento de um
pensamento materialista, o surgimento de um pensamento laico e a própria
necessidade da ciência vai formar as pessoas num espirito muito mais aberto,
muito mais no espirito da curiosidade do querer saber, da laicidade, porque é
necessário ser laico no capitalismo, mais do que nas outras formas sociais,
portanto, isso nos ajuda a compreender que para Marx a educação era fundamental
no sentido de que as pessoas se apropriassem de tudo aquilo que a humanidade
tinha produzido.
O capitalismo, a
primeira coisa que ele faz é separar o estado da religião, ele cria um estado
laico, mas, ao mesmo tempo em que ele cria um estado laico ele continua com o
núcleo doutrinário. Qual é o núcleo doutrinário? Que o capitalismo é muito bom,
que as formas jurídicas que o regem são boas, que é boa a propriedade privada,
que é bom vender e comprar força de trabalho, esse tipo de coisas, e isso o
capitalismo faz várias maneiras.
E Marx diz: "O
acesso à escola no sistema capitalista é seletivo e é de classe, obviamente se
você pertence as classes dominantes você vai ter um ensino muito mais
sofisticado, você vai ter acesso a escola muito mais facilitado; a escola, a
universidade, porque você tem dinheiro, você tem condições e obviamente aquele
que é filho do proletário, vai ter o acesso a escola que dê condições para que
ele manuseie as máquinas. Quando ele aprender tudo aquilo que ele precisa para
manusear as máquinas já está muito bom; ir para a universidade é outra questão,
não precisa, porque ele não precisa ser médico, ele tem que ser operário",
e se analisarmos hoje, é o que corresponde um pouco com a realidade, só que no
mundo contemporâneo também as contradições do capitalismo vão criando outras
questões, por exemplo, na medida em que se sofistica o processo produtivo, em
que o processo cientifico da produção é muito maior, obviamente o trabalhador
precisa agora ter um ensino muito mais sofisticado, então ele vai ter que ter o
acesso ao conhecimento muito mais sofisticado, você imagina que hoje vive em
uma sociedade da robótica, da química fina, da informática, então obviamente o
trabalhador precisa ter acesso a engenharia eletrônica, ter acesso a engenharia
biotecnológica, então obviamente que essas contradições vão se agudizando, e o
que Marx chama de 'o motor da historia', a luta de classes entre os oprimidos e
os opressores vai ganhando novas dimensões e novas formas – e diria – novas qualidades.
Há uma coisa que é
necessária dizer, que a escola é um aparelho ideológico do estado, como diziam
do aspecto doutrinário da escola, a escola é um reprodutor do sistema, isso para
todas as sociedades humanas, as escolas, os núcleos de ensino foram reprodução
dessa própria sociedade, a legitimação ideológica dessa sociedade, quando Marx
diz que o ensino tem que ser politécnico, ele quer dizer, que se você falasse
nos termos contemporâneos que o homem tem que ter amplo acesso ao conhecimento,
agora é claro que você em uma sociedade tão tecnológica e tão especifica, algum
tipo de especialização você tem que ter, pelo menos nessa sociedade que nós
vivemos, não há como saber como vai ser no futuro, mas é claro que você não
necessita, para ser engenheiro, somente aprender engenharia. Porque você não
pode ser um engenheiro que aprenda história? Que aprenda filosofia, que aprenda
arte, que conecta a ação de engenheiro com o conjunto da humanidade, e assim as
outras profissões.
Politécnica segundo Marx |
É isso o que Marx
queria dizer, o politécnico seria a ampla visão daquilo que a humanidade
produz, porque tem outra máxima que Marx gostava de usar: "Nada do que é
humano me é estranho", quer dizer, nessa outra máxima, tudo aquilo que a humanidade produz eu tenho
que saber, eu tenho que ter pelo menos o direito de poder conhecer, o
direito de poder ir, o direito de visitar o Louvre, o direito de um dia poder
visitar a pinacoteca do estado, é isso que ele quer dizer.
Grato pela atenção! |
Salve meu querido prazer em lê-lo, adoro seus pontos de vista e uma observação eu não consegui entrar no linck que passou para ler alguns documentos. Como você esta? Espero que bem, e o seu mestre onde anda? Beijos bom final de semana, até.
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